"Eu Contra Eu"

 

 

Escritos de Chico Xavier

18/12/2009

Quando o HOMEM, ainda jovem, desejou cometer o primeiro desatino, aproximou-se o Bom-Senso e observou-lhe: 

Detém-te! Por que te confias assim ao mal? 
O interpelado, porém, respondeu orgulhoso: 
Eu quero. 

 

Passando, mais adiante, à condição de perdulário e adotando a extravagância e a loucura por normas de viver, apareceu a Ponderação e aconselhou-o: 
Pára! Por que te consagras, desse modo, ao gasto inconseqüente? 
Ele, contudo, esclareceu, jactancioso: 
Eu posso. 

 

 

Mais, tarde, mobilizando os outros, a serviço da própria insensatez, recebeu 
a visita da Humildade, que lhe rogou piedosa: 
Reflete! Por que não te compadeces dos mais fracos e dos mais ignorantes? 
O infeliz, todavia, redargüiu, colérico: 
Eu mando. 

 

Absorvendo imensos recursos, inutilmente, quando podia beneficiar a coletividade, abeirou-se dele o Amor e pediu: 
Modifica-te! Sê caridoso! Como podes reter o rio das oportunidades sem 
socorrer o campo das necessidades alheias? 
E o mísero informou: 
Eu ordeno. 

 

 

Praticando atos condenáveis que o levaram ao pelourinho da desaprovação 
pública, a Justiça acercou-se dele a recomendar: 
Não prossigas! Não te dói ferir tanta gente? 
O infortunado, entretanto, acentuou implacável: 
Eu exijo. 

 

E assim viveu o Homem, acreditando-se o centro do Universo, reclamando, 
oprimindo e dominando, sem ouvir as sugestões das virtudes que iluminam 
a Terra, até que um dia, a Morte o procurou e lhe impôs a entrega do corpo físico. O desditoso entendendo a gravidade do acontecimento, prosternou-se diante dela e considerou: 
Morte, por que me buscas? 
Eu quero - disse ela. 
Por que me constranges a aceitar-te?, gemeu triste. 
Eu posso - retrucou a visitante. 
Como podes atacar-me desse modo? 
Eu mando. 
Que poderes te movem? 
Eu ordeno.

 

Defender-me-ei contra ti — clamou o Homem, desesperado — duelarei e 
receberás a minha maldição!... 
Mas a Morte sorriu, imperturbável, e afirmou: 
Eu exijo.

 

E, na luta do "eu" contra "eu", conduziu-o à casa da Verdade, para maiores lições.

* Pelo espírito Irmão X, no livro "Contos e Apólogos".