MATERIALISMO E NIILISMO

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          É realmente curioso ver o materialismo falar incessantemente da necessidade de resgatar a dignidade do homem, quando se esforça por reduzi-lo a um pedaço de carne, que apodrece e desaparece sem deixar qualquer vestígio; de reivindicar para ele a liberdade como um direito natural, quando o transforma num mecanismo, agindo como um autômato, sem responsabilidade por seus atos.

          Com o ser espiritual independente, preexistente e sobrevivente ao corpo, a responsabilidade é absoluta. Ora, para o maior número, o primeiro, o principal móvel da crença no niilismo, é o pavor que causa essa responsabilidade, fora da lei humana, e à qual se crê escapar, tapando os olhos. Até hoje esta responsabilidade nada tinha de bem definido; não era senão um medo vago, fundado, é preciso reconhecer, em crenças nem sempre admissíveis pela razão; o Espiritismo a demonstra como uma realidade patente, efetiva, sem restrição, como uma consequência natural da espiritualidade do ser. Eis por que certas pessoas têm medo do Espiritismo, que as perturbaria em sua quietude, erguendo à sua frente o temível tribunal do futuro. Provar que o homem é responsável por todos os seus atos é provar a sua liberdade de ação, e provar a sua liberdade é resgatar a sua dignidade. A perspectiva da responsabilidade fora da lei humana é o mais poderoso elemento moralizador: é o objetivo ao qual conduz o Espiritismo pela força das coisas.

 

Livro:  Revista Espírita: Jornal de Estudos Psicológicos – Ano XII, 1869

            (nº 3 - março de 1869)

            Allan Kardec

          FEB - Federação Espírita Brasileira